COMPANHEIRO ARTUR DA TÁVOLA,
Antonio Cabral Filho - Rj
TRINTA ANOS SEM JACOB
Artur da Távola
TITO MADI "O ACENTO
ÁRABE NO CANTO BRASIL"
Artur da Távola
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Estes dois livretos acima são tudo que preservo dos tempos da minha correspondência com o escritor e parlamentar Artur da Távola. Nossa digamos assim "aproximação" se deu durante os tempos das DIRETAS JÁ, quando eu trabalhava numa grande livraria de Ipanema, Rio de Janeiro. Ele trabalhava na agência de um grande banco localizada em frente à livraria e nas suas horas de folga, ia lá para a livraria, pegava um copo de água, que servíamos aos clientes e se sentava lá seção de livros infantis, cheia de cadeirinhas para incentivar as crianças a ler. Ficava lá infinitamente. Não incomodava para nada, não mexia em nada, não desarrumava nossas estantes, não deixava lixo no local, caso comesse alguma coisa, não fazia barulho quando tinha criança lendo, e quando vinha com o paletó, era muito difícil não esquecê-lo. Pouquíssimas vezes conversava com alguém. Às vezes entrava calado e saía como entrou. Nunca o vi examinar a mesa de best-sellers a procura dos seus livros. Como expúnhamos os autores brasileiros numa área exclusiva, era fácil localizar-se, pois montávamos balões com os livros do momento erguidos por eles.
Certa vez eu estava montando uma exposição com os livros dele, porque tínhamos acabado de receber uma remessa, na qual vinha um lançamento. Aí, eu fiz uma tira de livros e prendi num gancho parafusado no teto, de modo que ficou bem destacado seu livro. Ele se aproximou, olhando a exposição, ficou examinando a tira de livros e perguntou-me de quem foi a ideia. Nesse momento, eu fiquei sem saída, por que não sabia o que responder, pois ele podia não ter gostado, achado a ideia ridícula ou coisa parecida. Então, lhe disse, gaguejando, que nós fazemos isso o tempo todo, temos que promover o livro, que são exigências da editora ou da distribuidora e se o livro não vender, parte da culpa é nossa. E, mostrando meu embaraço, perguntei-lhe se ficara ruim, e ele quase num grito, respondeu "não!, ficou ótimo!", e disse que a ideia era perfeita, pois o livro estava visível de todos os cantos da loja. Em seguida, lhe falei dos pôsteres a serem pendurados dentro das vitrines com a foto do lançamento na semana anterior. "Muito bom, muito bom!" foram as suas últimas palavras, ditas se retirando, não sei se por satisfação ou por notar que deixou-me todo sem jeito.
No dia seguinte, ao chegar na mesa dos seus livros, foi cercado por uns vinte clientes, todo mundo pedindo autógrafo, e logo convidei-o para a seção dos livros infantis, para autografar os livros e receber seus leitores, devidamente sentado, com água, copos, cadeiras à disposição e alguma privacidade em relação ao público geral. Ele topou e conduziu todos os leitores para lá, se sentou e começou a autografar livros e conversar com as pessoas. No início, eu pensei que aquilo passaria rápido, mas notei que começou a se formar uma aglomeração, com pessoas chegando, pegando o livro e já formando fila. Ele entregou um bilhete para a operadora de caixa, solicitando biscoitos de polvilho, ou coisa parecida, bem leve, para distrair quem estava esperando. Foi aí que senti a coisa ficando séria, porque para se fazer um lançamento, primeiro faz-se uma programação, um planejamento, uma previsão a respeito do evento, mas assim de "happining", não dá. Mas o estoquista foi correndo à padaria e trouxe uma montanha de biscoitos, organizou em bandejas de papel e foi servindo ao pessoal, enquanto avisava que não tinha refrigerante, mas apenas água.
Bom, para encurtar, foi um sucesso tão grande, que ele se levantou da cadeira e começou a autografar em pé mesmo, devido à dor nas costas causada pela mesa baixa, enquanto se desculpava com seus fãs, tentando se desvencilhar deles. Sei apenas que em duas horas " de brincadeira", nós vendemos cem exemplares de livros de Artur da Távola, pois até quem não era seu leitor e entrou na livraria naquele momento acabou comprando só pra levar o autógrafo.
Passados alguns anos, ele saiu candidato, logo pelo psdb, partido arqui-rival do pt, devido à disputa pela intelectualidade. Nessa época, lhe encontrei na rua, em campanha, distribuindo seu panfleto, cercado de correligionários e lhe perguntei " por quê psdb?!" e ele respondeu-me com aquela calma da sabedoria que " no psdb, eu faço e no pt, eu seria "feito!"" e lhe avisei que não poderia votar nele porque já tinha me comprometido com o Vladimir Palmeira, mas a sua resposta ficou gravada na minha mente até agora: "Sem problema! Nós somos companheiros, temos as mesmas atitudes, estando no mesmo partido ou não."
Fui e após as eleições, fiz contato com ele, travamos uma correspondência até aos seus últimos dias, e quando ele morreu, a minha emoção fez-me doar todos os seus livros, inclusive a Revista Contato, para a Faculdade de Educação da Uff, não porque não os quisesse, mas devido ao fato de " perder um companheiro".
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