domingo, 31 de maio de 2015

Alice No País Das Maravilhas / Lewis Carrol * Antonio Cabral Filho - RJ


Era uma menina estudiosa, vinha sempre
 à biblioteca pesquisar. Nunca desarrumava
 a seção dos livros que usasse e sempre pedia 
licença para consultar algo que fosse mais 
reservado, além de nunca se despedir sem
antes agradecer pela atenção dispensada.
- Gente fina é outra coisa, pensava a bibliotecária.
Quando a menina saía, parece que ficava um
 buraco, um oco, um váquo na biblioteca
 tamanho era o vazio  que sua ausência 
causava. É que a presença dela ali sentada 
caladinha folheando livros, fazendo 
anotações em seu caderno, às vezes
 escrevendo por longo tempo, elevava
a sensação da importância da biblioteca,
 da sua dimensão incomensurável como
 espaço de leitura, pesquisa, lazer e fator
 cultural na vida das pessoas.
- A senhora pode me ajudar... Seus
 pedidos vinham sempre precedidos
 pelo gesto de humildade, fazendo com
 que qualquer um se colocasse ao seu 
dispor, pronto a colaborar para o seu sucesso.
Da última vez que veio à biblioteca, ela 
estava fazendo um trabalho sobre contos
 de fadas. Chegou devolvendo o Psicanálise
 dos Contos de Fadas, do Bruno Bethelhime,
 após ler vários do assunto, mas precisava de
 um suporte prático, e, entre tira-e-põe livros
 na seção, espalhou alguns sobre a mesa, 
junto com seus cadernos, pastas e bolsa. 
-Tem algum livro de contos de fadas?
 Perguntou, enquanto recolhia os livros
 para arrumá-los nos respectivos lugares.
 Quando a bibliotecária respondeu que iria
 procurar imediatamente algo que lhe
atendesse, rapidamente pôs dentro de 
seu caderno o Alice no País das Maravilhas,
 do Lewis Carrol, e jogou a bolsa por cima,
 foi para a estante guardar os outros e gritou 
"deixa pra lá, depois eu vejo isso", crente que 
a bibliotecária não tinha notado nada, demorou
 o suficiente para que a mesma voltasse à 
sua mesa, se certificou de que os livros estavam
 organizados corretamente e passou aos 
agradecimentos de praxe, como sempre 
fazia, expressando sua preciosa humildade,
 pegou a bolsa, pôs o caderno com o livro
 dentro de uma pasta e foi saindo.
- Boa leitura, você merece! Disse a
 bibliotecária, sem dirigir-lhe o olhar.
 Ela agradeceu e partiu se perguntando
 " Será que ela percebeu?"
***

domingo, 24 de maio de 2015

Canto Brasileiro, Paulo Sérgio Pinheiro * Antonio Cabral Filho - RJ

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Há algum tempo eu trabalhava numa
 livraria e notei que um cliente entrava,
 andava a loja toda, não falava com 
ninguém e, de repente, sumia. Seu
 comportamento mexeu comigo e 
passei a observá-lo a partir daí. T
odo dia, ele entrava na livraria, 
circulava e desaparecia. Saía repentinamente. 
Confesso que pass
ei a "escoltá-lo", como diz a gíria policial.
 Após algum tempo notei que ele estava 
"marcando" os livros que queria. Até aí,
 "no problem!" Mas um dia eu o flagrei: 
Num movimento brusco, ele pôs o
 livro Conceitos Elementares do
 Materialismo Histórico, de Martha
 Harnecker, embaixo da jaqueta 
us-top bordada com Jimi Hendrix 
de roqueiro e evaporou!
Confesso, também, que odeio ladrões, e
 me prometi "amassar o cano" dele ou 
"escrachá-lo", como diz o Vagner Montes.
 Dito e feito, no dia seguinte, mesma 
hora, mesma jaqueta, mesma rapidez, 
pegou o livro Vanguarda Europeia e
 Modernismo Brasileiro, meteu embaixo
 da jaqueta e partiu em direção à porta, 
mas a arapuca estava armada: Eu, Niltim
 e Fabrízio emparedamos na saída; quando
 ele notou, era tarde. Pedi-lhe o livro e
 perguntei se queria apanhar ali mesmo
 ou lá no depósito; ele rodou nos calcanhares, 
pôs o livro sobre o balcão e perguntou:
"Quê livro?!" e expliquei-lhe que se
 voltasse à livraria, iria entrar no cacete lá no depósito.
Passaram-se vários dias sem que ele 
aparecesse; então concluí que tinha
 funcionado meu esquema. Como gosto
 muito de artesanato, sempre ia passear 
na Feira da Praça General Osório, em
 Ipanema, na hora do almoço, gosto
 de escolher minhas peças bem detalhadamente
 e com o devido cuidado, para não ter
 dissabores a posteriori. Por isso, demorava
 muito tanto na feira como nas 
barracas onde parava. E foi num momento
 assim que visualizei uma lona estirada
 no chão cheia de livros, tendo ao 
lado, sentado numa cadeira de vime, 
nada mais nada menos, que aquele "nobre ladrão".
Aproximei-me bem devagar, na verdade
 para que ele notasse a minha presença. 
Ele é branco, magro, alto, usa cabelo estilo Robin Hood, 
e se levanto
u dizendo "assim não vale!", "Calma", 
respondi-lhe, "Eu só quero os que 
você roubou lá no meu trabalho." Aí ele
 rodou nos calcanhares do mesmo jeito
 que fizera lá na loja e eu não agüentei e 
caí na gargalhada, exclamando "Como 
você é ridículo, rouba de um lado da rua 
e vai vender no outro!" Mas aí vi o livro
 CANTO BRASILEIRO, do Paulo Sérgio 
Pinheiro, e perguntei-lhe aonde roubara
 este livro; "Como eu vou saber..." 
"Então eu vou levá-lo por pagamento
 dos que você já roubou na loja!" Peguei o livro e fui. 
Daí em diante, voltei mais assiduamente 
à feira, e passei a não hostilizá-lo mais,
 e em compensação ele não roubou mais 
lá onde eu trabalhava, tornei-me seu 
"cliente", e, passadas algumas décadas, 
lhe perguntei: J, você ainda rouba
 livros? "P... Cabral!"...
Hoje ele é um conceituado professor de 
história com diversos livros editados 
na área e, acima de tudo, meu amigo.
 Eis acima o livro que eu expropriei dele.
***

domingo, 17 de maio de 2015

Companheiro Artur Da Távola * Antonio Cabral Filho - Rj

COMPANHEIRO ARTUR DA TÁVOLA,
Antonio Cabral Filho - Rj
TRINTA ANOS SEM JACOB
Artur da Távola
TITO MADI "O ACENTO 
ÁRABE NO CANTO BRASIL"
Artur da Távola
***
Estes dois livretos acima são tudo que preservo dos tempos da minha correspondência com o escritor e parlamentar Artur da Távola. Nossa digamos assim "aproximação" se deu durante os tempos das DIRETAS JÁ, quando eu trabalhava numa grande livraria de Ipanema, Rio de Janeiro. Ele trabalhava na agência de um grande banco localizada em frente à livraria e nas suas horas de folga, ia lá para a livraria, pegava um copo de água, que servíamos aos clientes e se sentava lá seção de livros infantis, cheia de cadeirinhas para incentivar as crianças a ler. Ficava lá infinitamente. Não incomodava para nada, não mexia em nada, não desarrumava nossas estantes, não deixava lixo no local, caso comesse alguma coisa, não fazia barulho quando tinha criança lendo, e quando vinha com o paletó, era muito difícil não esquecê-lo. Pouquíssimas vezes conversava com alguém. Às vezes entrava calado e saía como entrou. Nunca o vi examinar a mesa de best-sellers a procura dos seus livros. Como expúnhamos os autores brasileiros numa área exclusiva, era fácil localizar-se, pois montávamos balões com os livros do momento erguidos por eles. 

Certa vez eu estava montando uma exposição com os livros dele, porque tínhamos acabado de receber uma remessa, na qual vinha um lançamento. Aí, eu fiz uma tira de livros e prendi num gancho parafusado no teto, de modo que ficou bem destacado seu livro. Ele se aproximou, olhando a exposição, ficou examinando a tira de livros e perguntou-me de quem foi a ideia. Nesse momento, eu fiquei sem saída, por que não sabia o que responder, pois ele podia não ter gostado, achado a ideia ridícula ou coisa parecida. Então, lhe disse, gaguejando, que nós fazemos isso o tempo todo, temos que promover o livro, que são exigências da editora ou da distribuidora e se o livro não vender, parte da culpa é nossa. E, mostrando meu embaraço, perguntei-lhe se ficara ruim, e ele quase num grito, respondeu "não!, ficou ótimo!", e disse que a ideia era perfeita, pois o livro estava visível de todos os cantos da loja. Em seguida, lhe falei dos pôsteres a serem pendurados dentro das vitrines com a foto do lançamento na semana anterior. "Muito bom, muito bom!" foram as suas últimas palavras, ditas se retirando, não sei se por satisfação ou por notar que deixou-me todo sem jeito.

No dia seguinte, ao chegar na mesa dos seus livros, foi cercado por uns vinte clientes, todo mundo pedindo autógrafo, e logo convidei-o para a seção dos livros infantis, para autografar os livros e receber seus leitores, devidamente sentado, com água, copos, cadeiras à disposição e alguma privacidade em relação ao público geral. Ele topou e conduziu todos os leitores para lá, se sentou e começou a autografar livros e conversar com as pessoas. No início, eu pensei que aquilo passaria rápido, mas notei que começou a se formar uma aglomeração, com pessoas chegando, pegando o livro e já formando fila. Ele entregou um bilhete para a operadora de caixa, solicitando biscoitos de polvilho, ou coisa parecida, bem leve, para distrair quem estava esperando. Foi aí que senti a coisa ficando séria, porque para se fazer um lançamento, primeiro faz-se uma programação, um planejamento, uma previsão a respeito do evento, mas assim de "happining", não dá. Mas o estoquista foi correndo à padaria e trouxe uma montanha de biscoitos, organizou em bandejas de papel e foi servindo ao pessoal, enquanto avisava que não tinha refrigerante, mas apenas água. 

Bom, para encurtar, foi um sucesso tão grande, que ele se levantou da cadeira e começou a autografar em pé mesmo, devido à dor nas costas causada pela mesa baixa, enquanto se desculpava com seus fãs, tentando se desvencilhar deles. Sei apenas que em duas horas " de brincadeira", nós vendemos cem exemplares de livros de Artur da Távola, pois até quem não era seu leitor e entrou na livraria naquele momento acabou comprando só pra levar o autógrafo.

Passados alguns anos, ele saiu candidato, logo pelo psdb, partido arqui-rival do pt, devido à disputa pela intelectualidade. Nessa época, lhe encontrei na rua, em campanha, distribuindo seu panfleto, cercado de correligionários e lhe perguntei " por quê psdb?!" e ele respondeu-me com aquela calma da sabedoria que " no psdb, eu faço e no pt, eu seria "feito!"" e lhe avisei que não poderia votar nele porque já tinha me comprometido com o Vladimir Palmeira, mas a sua resposta ficou gravada na minha mente até agora: "Sem problema! Nós somos companheiros, temos as mesmas atitudes, estando no mesmo partido ou não."

Fui e após as eleições, fiz contato com ele, travamos uma correspondência até aos seus últimos dias, e quando ele morreu, a minha emoção fez-me doar todos os seus livros, inclusive a Revista Contato, para a Faculdade de Educação da Uff, não porque não os quisesse, mas devido ao fato de " perder um companheiro".
***

domingo, 10 de maio de 2015

FUMACÊ DA SUCAM * Antonio Cabral Filho - RJ


FUMACÊ DA SUCAM

*

FUMACÊ DA SUCAM MATA 

FLAMENGUISTA DE RAIVA! Foi a 

manchete dos jornais no dia seguinte, 

falando da morte de Seu Zico.

Seu Zico, ou melhor, Agripino José da Silva, teve seu nome real conhecido só depois de morto, segundo alguns porque era “cassado pela ditadura”.

Ele morava ali na Rua Moncorvo Filho, próximo ao CACO, quase em frente ao Campo de Santana.

Para quem não sabe, CACO é a sigla do Centro Acadêmico Cândido de Oliveira, a maior fortaleza de luta pela democracia no Brasil, inúmeras vezes invadido pelos gorilas da ditadura, forjada pelos estudantes de direito da UFRJ, segundo Seu Zico.

Quando a SUCAM aparecia no trecho, vindo lá da Frei Caneca ou do Souza Aguiar, Seu Zico ficava louco, e corria pra guardar os passarinhos, punha-os lá no alto do seu casarão, no sótão, quase defronte ao prédio da UFRJ. Aí ele saía pra rua e ficava “escoltando os mata-mosquitos”, como ficou conhecido o pessoal que trabalha na SUCAM, na função de guarda de endemia. Enquanto não fossem embora, e sumissem lá pras bandas da Cruz Vermelha, Seu Zico não sossegava. Depois, só depois, ele respirava aliviado e ia ver os “preju”, se perdera ou não algum pássaro do seu plantel. Aí, uma vez feito o “balanço”, ia para o bar do Zezé, tomar limão e xingar um pouco, para descontrair, pois na última visita da SUCAM, ele perdera um canário da terra, peça nobre no patrimônio de qualquer passarinheiro. Desta vez, segundo ele, perdeu um pássaro de “responsa”, um baita preju... Foi-se o sei tié!

E toma limão! Era um atrás do outro. Sempre punha sal na batida, diz que pra tirar o veneno. Nessas ocasiões, Seu Zico não dispensava as companhias de Dicró, Moreira da Silva, Bezerra da Silva, mais alguns bregas, desses que tocam naquelas máquinas de ficha.

Como o bar ficava muito cheio, Seu Zico pegava a batida e se sentava no batente da casa ao lado, e bebia, bebia, bebia até morgar, depois de xingar por horas a fio, triste pela perda do seu passarinho. A perca do tiê, bicho de estimação, cantador, manhoso,  deixou Seu Zico tão triste que ele apagou na calçada mesmo. Ficou lá, estiradão, como se ressonasse em sono profundo.

Nessas ocasiões aparecia a Dona Tereza. Tinha que ser Tereza! Procurava “cadê o Zico?”, toda tonta, meio que preocupada meio que envergonhada com um marido tão trapalhão.

Ninguém se preocupava com os escândalos dele, que pra fazer jus ao apelido, era “framenguista increnquero, porra!”
E ostentava seu corpão de pedreiro véio batedor de “vinte e cinco libras”, que só embolsava parede por metro quadrado com dois ajudantes pra servir-lhe massa bem traçada.

Mas todo dia é dia da caça e nem sempre do caçador... Numa dessas visitas da SUCAM, Seu Zico perdeu seu Assum Preto, vindo lá da terrinha, trago com todo carinho, e personalidade ímpar do seu plantel de pássaros . Nesse dia, ele bebeu demais, bebeu até cair e, como ninguém ligasse com seus aprontos, também ninguém ligou a mínima com ele deitado na calçada, como que adormecido. Quando Dona Tereza chegou e balançou-o para acordá-lo, era tarde. Ela começou chorar aos soluços, entrecortados pelo susto, pedindo-lhe para parar de brincadeira, mas antes fosse. Apareceu alguém que se dispôs a massagear seu tórax, na tentativa de talvez reanimá-lo, mas que nada! Seu Zico tinha apagado!!

Entre choro, resmungos e interjeições, “salta mais um limão!”, gritou alguém, enquanto na vitrola-máquina rolava a música do Dicró, “ desce mais um limão...”
No corre-corre pra recolher o corpo, nem Dona Tereza se preocupou em pegar o seu chapéu, que o cronista expõe com muito orgulho...
***

domingo, 3 de maio de 2015

Crônica QRU Das Águas * Antonio Cabral Filho - RJ

QRU CIA DAS AGUAS

Sexta-feira é batizada pelo folclore popular  como dia de pular o muro, tomar mais uma com os amigos, esticar a saideira,  mas fui ao Fórum, ter mais uma audiência com a Cia das Águas. Foi muito engraçada!

Logo que cheguei, encontrei meu advogado saindo da Sala de Conciliação, acabando de ganhar mais uma “questã”, como diz ele. Nos cumprimentamos e fomos sentar para conferir os papéis. Tudo ok, nos pusemos a procurar café, mas a dois reais, valia a pena filar na OAB.

Antes preciso dizer-lhe qual é o meu QRU com a Cia das Águas: É que no local onde moro, não tem abastecimento de água instalado por ela. E como é anexo ao Parque Estadual da Pedra Branca ( que aliás ando procurando, pois só vejo Pedra Negra!), os mais potentados localizam uma nascente e aí constroem um reservatório, instalam canos e se abastecem de água à vontade. Ocorre que essas pessoas, geralmente, têm algum vínculo com o Poder ou são “quiprocós” mesmo, e quem não é nem um nem outro, fica a ver navios...

Assim que comprei o meu imóvel, percebi que a rede de água local “é dos moradores” e não da Cia, uma vez que fui informado apenas que aqui todo mundo estava no “gato”. E, como bom mexedor de pausinhos, procurei levantar quem daqui era ligado aos políticos. Consegui chegar no Seu Mané da Padaria, dono da única no lugar. Aí, de pão em pão, ele foi se entregando, falando quem era o vereador responsável por esta “freguesia”.

Como você sabe, o sujeito que tem política na veia, não consegue ficar de fora, fingindo que não está vendo, ignorando, fugindo da “Hora do Brasil”, e acabei marcando com ele uma visita ao vereador. Ficamos de nos encontrar numa quinta-feira, à tardinha, cinco horas, na Padaria Nobreza, no miolo da Taquara. Tão logo nos falamos, encostou uma caminhonete preta e desceu um dos “Barrão”, pois são dois e irmãos, com uma maleta na mão e se dirigiu a nós. Cumprimentou o Seu Mané e, assim que fui apresentado, fui cumprimentado também e ambos convidados a subir com ele para o “escritóro”, que é uma loja de venda de passagens muito antiga naquele local e funciona no segundo andar. Ao entrarmos na sala, deparei-me com a Tereza Cascão, pulissa e mulher de puliça. Meus botões me fizeram um monte de perguntas, mas depois eu explico. Ela se dirigiu ao vereador como “chefe” querendo saber do que ele precisava, “água e copos!”, foi a resposta, seca. Ela sorriu pra mim, com intimidade, devido aos nossos confrontos em manifestações. Foi à geladeira, enquanto nos ajeitávamos com mesa e cadeiras, pegou os copos com a garrafa e pôs numa bandeja, trouxe e colocou entre nós, perguntando “vai ter baderna?”, dei-lhe uma olhada fria, de cima a baixo, coroada pela resposta do “ome”: “Seu Antonio é nosso amigo!”, ao que ela rodou nos cascos e cambou fora. Não apareceu mais até ao final da reunião.

Foi o encontro com político mais proveitoso de toda minha vida de atuação nos movimentos sociais! Explico por quê: Quando lhe demonstrei a nossa situação, ele tirou da pasta uma folha de papel com o número do protocolo da Secretaria de Obras do Estado autorizando o início das obras de instalação de rede de água em nossa rua com data de quinze anos atrás e disse, olho no olho, que “sem apoio popular, eu não desentoco essa preá!” olhei para o Seu Mané, respirei fundo, e disse-lhes que precisava de um caro de som, pelo menos dez faixas reivindicando água, cinco mil panfletos que “EU” mesmo escreveria, chamando o povo da região e denunciando aquele “descalabro!” e fecharíamos a rodovia principal, o vereador compareceria fingindo total desconhecimento: “Fechado!”, gritaram em uníssono ele e Seu Mané.

Prometo não chatear mais, mas foi sucesso total! Um ano depois da “baderna assistida pela Pulissa Cascão”, foi inaugurado o abastecimento de água no meu trecho, com direito a discursos, comes-e-bebes-etc! E como prêmio, ao invés de água, passamos a receber da Cia das Águas, contas. Isso! Contas! Após enfrentar filas quilométricas, embaixo do sol escaldante de verão, perder dia de trabalho, para obter um serviço pelo qual você quer pagar, o que nos é entregue são contas, cartas do SPC, avisos de corte e o riso debochado de quem faz a lei com as próprias mãos.

Moral da história: Imagina no que deu? Sexta-feira última no Fórum! Sabe o por quê? Assim que as pessoas se cadastram, a Cia das Águas passa a lhes cobrar por um serviço não prestado, mas quando eu vi meu nome no SPC, pensei cá comigo: É tudo que eu preciso! Fui ao advogado e na hora que foi anunciada a nossa audiência, ele gritou “causa ganha!” e entramos. A Cia das Águas enviou dois advogados. Um lia os autos para o outro, que fazia inquirições ao meu advogado, até que se dirigiu a mim, perguntando “como era o abastecimento antes”. Pedi-lhe licença e dirigi-me ao meu advogado, perguntando-lhe “como era uma coisa que não existe, nunca existiu...” Eles apenas riu e disse “data vênia meritíssimo”, pedindo-lhe que anulasse todas as perguntas da “RÉ” por serem improcedentes. O juiz  acrescentou o fato de a Cia das Águas não ter apresentado nenhuma prova técnica em sua defesa.
Deu por encerrada a audiência e saímos comemorando!
***