A Educação Como Cultura,
Carlos Rodrigues Brandão,
Editora Brasiliense, 1985.
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CRÔNICA DO LAVRADOR DAS ALMAS
Desde muito cedo, creio que por volta dos 15-16 anos, passei a crer que a educação é um dos maiores instrumentos de transformação social. Por exemplo, sempre constatei que pessoas cultas vivem melhor. Ou seja, se alimentam melhor, se vestem melhor, se relacionam melhor com o mundo, são mais felizes em tudo que fazem, sobretudo, no amor, como provam Sartre e Simone de Beauvoir.
Se algum dia, alguém quiser saber sobre mim, saibam que eu venho da Passeata dos Cem Mil, aonde fui me encontrar comigo mesmo, antes de completar 16 anos. Me confrontei sempre, seja com meus pre-conceitos, vindos do berço, seja com os vindos do mundo. Mas sempre me confrontei mais ainda com os conceitos impostos por algum instrumento de opressão.
Mas a minha maior vitória, a minha maior felicidade, contra tudo que vislumbro no mundo da opressão, é constatar que pessoas como Rubem Alves, Nelson Mandela, Paulo Freire, e tantos e tantos contadores de causos pelo mundo afora, sobretudo no mundo rural, principalmente brasileiro, são pessoas que comungam comigo do mesmo sentimento: Transformar pela educação. Nesse conjunto, eu incluo o Carlos Rodrigues Brandão, que através do seu livro citado acima, deu-me segurança quanto aos meus conceitos espontâneos de trabalho revolucionário. Foi com esse livro que eu parei de fazer uma militância política voluntarista e passei a montar oficinas de trabalhos culturais, desenvolvendo teatro, literatura, cinema, artes plásticas e contação de histórias, como sedimentação da memória individual. Inicialmente, isso foi fonte de conflito com os grupos organizados no interior dos movimentos populares, mas eu passei a ignorá-los e segui adiante, realizando meus projetos de modo individual, contando apenas com o interesse das pessoas carentes de informação.
Confesso que foi doloroso, principalmente ver a maioria das "Correntes de Esquerda" mergulharem na social-democracia, serem tragadas pelo PT e pelo populismo católico, disfarçado de Teologia da Libertação. Não me intimido ante a avalanche de ONGs, todas gerando "boquinhas" para uns e desilusão para a maioria; todas empenhadas em fazer do povo vaquinha de presépio dos seus interesses escusos, incapazes de trabalharem junto ao seu semelhante com o único objetivo de aguçar a sua consciência humana e cidadã.
Nessa minha humilde trajetória, desde os anos setenta, encontrei muitos intelectuais comprometidos com a transformação das consciências rumo à transformação social, mas poucos contribuiram comigo tanto como o Carlos Rodrigues Brandão, talvez mais pela leitura particular que faço dos seus trabalhos, como por exemplo o texto de abertura do livro acima: "A MENINA QUE LÊ...
Certamente a menina lê. A corda frouxa entre a mão direita e o pescoço do boi - ou será um búfalo? - sugere que não há esforço e, menos ainda, perigo, embora o animal seja imenso e ela pequena. A quietude do olhar do bicho não deixa dúvidas: apesar do longo chifre, ele é manso e, mais do que apenas domesticado, é doméstico. Não fosse assim, quem o entregaria aos cuidados de uma menina pequena e descalça, que lê enquanto trabalha e caminha? Pois, pelo menos enquanto atravessam a trilha ao longo do canal, parece nem ser necessário prestar atenção ao caminho e ao trabalho e, por isso, é possível ler."
Me contento apenas com esse trecho do texto do CRB, para a partir daí, desenvolver uma longa oficina de texto e de leitura, seja com crianças, seja com adultos, uma vez que o nosso "mundo moderno" nos impõe dificuldades terríveis para pegarmos um livro, sobretudo no campo.
Por isso, em mais um DIA DO AGRICULTOR E DO LIVRO, registro a minha singela homenagem
LAVRADOR E ESCRITOR
COMUNGAM RAZÕES DE ORGULHO,
POIS TRANSCENDEM DE FERVOR
NO 25 DE JULHO.
ANTONIO CABRAL FILHO, Rio de Janeiro -Rj
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